No último dia 8 de Junho, o jornalista Lucas Rivas através do canal Agrolink News, podcast oficial do maior portal de conteúdos do setor do agronegócio brasileiro, entrevistou Daniel Augusto Cavalcante, doutor em Tecnologia de Alimentos pela UNICAMP e CEO da Baldoni, empresa apoiadora da Associação Brasileira de Estudos das Abelhas (A.B.E.L.H.A.).
Confira o conteúdo da entrevista:
LUCAS: Como o senhor está avaliando agora o mercado de mel para os produtores brasileiros.
DANIEL: O mercado do mel para os produtores hoje está promissor, principalmente pelo aumento que nós tivemos na demanda do mel pelo mercado externo. Os grandes consumidores de mel como Europa e Estados Unidos. (Principalmente os Estados Unidos, no caso do Brasil, que exporta boa parte do seu mel) vem comprando um número bem maior do que costumavam comprar anteriormente. Para você ter ideia, nós exportávamos em 2017 cerca de 25 mil toneladas de mel, e o ano passado, quatro anos depois, a gente foi a mais de 40 mil toneladas de Mel exportado. Isto é um volume significativo! O Brasil não é um grande produtor de mel ainda, e a gente precisa melhorar muito com relação à produtividade. Este aumento na demanda acabou desbalanceando a curva de oferta e demanda, e nós, por termos uma produtividade relativamente constante, aumentamos os preços. Dessa forma, os preços que nós pagávamos no mel, tanto para o mercado interno quanto para o mercado externo, em outubro do ano passado, foi ao redor de R$ 7,50 e R$ 8,00. Agora estamos pagando, no início do mês de junho, algo em torno de R$ 15,00 e R$ 15,50.
LUCAS: A gente sabe que o mundo vive uma dificuldade em atender a demanda por Mel, isso pode favorecer a produção nacional?
DANIEL: O mundo vive, realmente, uma dificuldade para poder atender essa demanda de mel. E isso pode, de certa forma, favorecer o apicultor brasileiro, se ele começar a trabalhar um pouco mais a produtividade das colmeias. Hoje, o Brasil tem cerca de três milhões de colmeias que produzem em torno de 45 mil toneladas de mel, uma média de 15 Kg de mel por colmeia/ano. Isso é uma produtividade muito baixa. Se a gente pegar a Argentina, por exemplo, ela tem um volume de colmeias bem menor, cerca de dois milhões de colmeias, que levam uma produção de mais de 90 mil toneladas fazendo da Argentina a segunda, às vezes, a terceira maior produtora de mel do mundo.
Se os produtores trabalharem a questão do manejo apícula, para que tenham uma produtividade melhor por colmeia, talvez a gente não precise crescer mais em colmeia. Só essa melhoria, já vai trazer um benefício bem mais significativo.
LUCAS: De acordo com levantamentos da Associação Brasileira de Estudos das Abelhas (A.B.E.L.H.A.), o país hoje tem um déficit em relação ao que é produzido e a demanda. Quais são os caminhos para melhorar este cenário?
DANIEL: Realmente, como eu disse, nós temos um déficit bem considerável. Nosso mel tem uma qualidade excepcional! Nós somos reconhecidos pela qualidade do nosso produto no mundo inteiro. Em diversas Apimondia (Congresso Mundial de Apicultura) as empresas brasileiras levaram o prêmio de melhor mel do mundo e isso faz com que o Brasil tenha destaque, quando visto pelo panorama global.
Essa procura do mel brasileiro acaba se ajustando, muitas vezes, em valores. E hoje, com uma desvalorização do real frente ao dólar, no mercado interno, em virtude dessa valorização, ela acaba tendo um valor considerável. Então, o melhor caminho que a gente teria hoje, para se ter um acerto nessa questão de produção e consumo, não só para o mercado externo (porque nós estamos crescendo consideravelmente as exportações) é o trabalho efetivo na busca de melhores manejos apícolas e o apicultor acreditar que o mel é um produto rentável, que vai complementar a sua renda.
LUCAS: Um dos desafios da produção brasileira é que ela está concentrada nos pequenos agricultores que não tem uma capacidade, nem interesse em expandir a sua produção. Existe alguma alternativa para modificar este cenário?
DANIEL: Este realmente é um grande desafio. Acontece que o apicultor, de maneira geral, tem o mel como a sua quarta, às vezes, a sua quinta renda. Então, a maioria desses pequenos produtores rurais, onde se concentram boa parte da produção agrícola no Brasil, são responsáveis por boa parte da geração do PIB que temos. Esses produtores têm lá uma roça de milho, algumas vacas que tiram leite e mandam para cooperativa, muitas vezes eles têm uma granja, seja de aves e suínos, e, por acaso, eles têm algumas colmeias. E essas colmeias eles visitam umas vezes a cada dois meses ou três meses, e tiram ali uma certa quantidade de mel. Por isso, a nossa produtividade é tão baixa, porque um apicultor tem como quarta ou quinta renda da sua propriedade, a atividade da apicultura. É isso que a gente precisa mudar. Mais de 50% da nossa produção de mel está na mão de praticamente metade dos apicultores que tem menos de 50 colmeias cada um. Falta uma profissionalização nesse mercado, que é um trabalho diário. Diariamente você tem que estar na lida, observando as suas colmeias, observando a postura de ovos da rainha, alimentar na entressafra, trocar essa rainha se ela não tiver com uma produção condizente com a quantidade de proteína, pólen ou carboidrato (mel) que está entrando dentro da colmeia, para que ela possa continuar crescendo. Então, realmente, é um grande desafio mostrar para esses pequenos agricultores, que a apicultura não pode ser uma atividade paralela.
LUCAS: Há poucos dias a A.B.E.L.H.A (Associação Brasileira de Estudos das Abelhas) realizou um evento para discutir a questão da produção de mel nas propriedades próximas as produções de soja. Essas duas culturas, mel e soja, podem conviver de forma simultânea?
DANIEL: Ah, foi mesmo. A Associação Brasileira de estudos de Abelhas, com a Ana, diretora executivo, e Antônio Celso, que trabalham juntos, fazem um trabalho maravilhoso de divulgação. A primeira atividade da apicultura é a polinização. E a ajuda na melhoria da produção de alimentos por meio da polinização, foi discutido na semana passada com um webinar muito bem-feito com relação à questão da produtividade de mel e a produção de soja. Então, é lógico que isso deve-se viver de forma simultânea. O contato direto entre o agricultor e o apicultor é essencial para que as práticas agrícolas, principalmente a utilização dos defensivos, seja feita no momento correto, para que não tenha perda das abelhas. Mas, é uma simbiose mútua, ganha-ganha, que existe tanto para o apicultor, que conseguiu tirar (pelo que nós podemos observar nesta discussão que a Associação Brasileira de Estudos de Abelha realizou) entre 20 a 25 kg de mel naquela florada, um volume maior do que a média que a gente tira no ano inteiro. E da mesma forma você observa um ganho na produtividade de soja de cerca de 15% com culturas, ou, dependendo do movimento, até 40% na produtividade da soja.
LUCAS: Daniel Augusto Cavalcante, diretor executivo da empresa Baldoni , muito obrigado por essa entrevista , até um próximo contato!
DANIEL: Muito obrigado pela oportunidade, coloco a Baldoni, e me coloco, à disposição do Agrolink. Qualquer coisa que precisar, não é difícil de nos encontrar. Forte abraço para todos!
Confira abaixo, o trecho do podcast com a entrevista, bem como o link oficial (na íntegra com outros assuntos) do podcast do AgroLink News.
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